São três as pragas que assolam a população no que se refere às opiniões expressas em redes digitais: ignorância, preguiça e má-fé. Embora cada um tenha o direito a opinar, importa diferenciar, como os gregos faziam, opinião (doxa) de conhecimento (episteme). Se a primeira se baseia em impressões superficiais e senso comum, o segundo se obtém no rigor lógico-científico, à base de pesquisas sérias. A partir do momento que um juízo é emitido ou exposto publicamente, está suscetível a ser avaliado. Assim, o respeito ao pensamento alheio não implica no silêncio diante do erro. Toda opinião é passível de crítica.
A ignorância corresponde ao desconhecimento. Aquilo que não se sabe, ignora-se. Em seu uso popular, o termo designa estupidez ou burrice, mas não é necessariamente assim. O desconhecimento do óbvio ou o equívoco deliberado sobre determinados assuntos – como quando se fala de algo que não se conhece – é também tratado por ignorância. Ninguém é capaz de saber de tudo, há sempre algo que se ignora, que se desconhece. Contudo, um terceiro uso é mais alarmante, aquele que corresponde ao desprezo. Ignorar, desprezar um conhecimento, pode significar resistência a mudar ou abrir-se. Diz mais de quem nega o saber do que aquilo que é negado.
Mas, porque não se busca conhecimento antes de se tecer uma opinião? Uma das razões possíveis é a preguiça. Quando alguém sabe que há outra perspectiva ou outro lado para uma mesma história e ainda sim o ignora, já não se trata mais da simples ignorância. A preguiça de buscar respostas, de ouvir outro lado, de saber do que realmente se fala antes de opinar, constitui uma das raízes da ignorância que se traveste de impropérios nos diversos discursos. Sem conhecimento de história, política, economia, filosofia, sociologia etc., diariamente se tecem comentários em supostas análises de conjuntura sobre a situação do país.
É certo que algumas pessoas não têm condições de investigar determinados saberes. Às vezes lhes falta o mínimo para que se possa construir determinada ideia sobre algo. São ignorâncias das quais a pessoa não tem culpa, podendo ela ser vítima de um sistema educacional deficitário ou mesmo de condições socio-econômicas desfavoráveis. Entretanto, o mesmo não ocorre com todo mundo. Muitos que dispõem dos meios necessários para investigar não o fazem por pura preguiça, mesmo com o acesso a Internet, que facilita o encontro de respostas. Mais difícil ainda é ser crítico às respostas que encontra e continuar buscando outras para confrontar os saberes e chegar à verdade. Isso se nota nos trabalhos escolares de diversos estudantes que copiam artigos da Wikipedia ou de outros sites sem a capacidade de averiguar se é algo fidedigno. O mesmo se vê no compartilhamento de notícias falsas sem que se busque em sites sérios e veículos tradicionais de imprensa que, geralmente, apuram notícias.
A preguiça pode vir acompanhada do excesso de confiança que se dá a um amigo ou liderança. Uma informação passada por um líder religioso, um familiar respeitável ou alguém com quem se compartilha ideiais e ideologias pode gozar de mais credibilidade pelo simples fato de se ter tais pessoas em conta. Assim, aposenta-se a crítica ou o trabalho de pensar e se apoia na moral ou autoridade representada por tais pessoas. Faz-se isso, delega-se a capacidade de pensar a outro, em geral, por dois motivos: o primeiro é o não responsabilizar-se pela própria vida e o segundo é a resistência em abrir-se. Caso algo dê errado, é mais fácil culpar quem lhe induziu ao erro. Muitos que vivem atrás de opinião alheia têm medo de tomar a própria vida nas mãos e ser responsável pelos próprios fracassos – mas acabam também por nunca se apropriarem de um possível sucesso.
O segundo motivo, a resistência em abrir-se, diz da incapacidade de encarar as próprias sombras. Alguns não só não se questionam, como também mentem para si mesmos. A isso chamamos má-fé, esse mecanismo de fuga que quer evitar a responsabilidade de ser quem se é; de arcar com as próprias decisões; de suportar a angústia existêncial, a falta de sentido, o vazio; ou mesmo de assumir que se alicerçou a vida em fundamentos frágeis. Na má-fé, busca-se quem possa referendar a própria mentira ou evitar qualquer conhecimento que mostre a si mesmo. Isso acontece muito, por exemplo, em temas de sexualidade, quando alguém, evitando os desejos que mantém recalcados, liga-se a discursos moralistas e religiosidades conservadoras, não por crença autêntica, mas por má-fé.
O triste é saber que ignorância, preguiça e má-fé caminham juntas e muitas vezes se resolvem em intolerância, em ataques a terceiros, em justificações ao injustificável. Muitos comentários que se leem em sites de notícias ou postagens de redes sociais envenenam a alma com seu ódio e colaboram com a desinformação ou deturpação de conhecimentos. Talvez a coisa mais saudável a se fazer é aderir ao princípio bastante divulgado na web para quem quer manter a esperança: “Não leia os comentários”.