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Já pensaram que só nos damos conta de certas partes do nosso corpo quando doem? Se não me doer o estômago, nem dou conta dele. Se não me doer a garganta, nem me dou conta dela. Quando tudo está bem é quando se torna invisível.

 

Não é assim que nos relacionamos com Deus?

 

Quando tudo está bem, o ser humano esquece Deus. Só quando faz a experiência do sofrimento é que se lembra de Deus. Penso que a razão esteja na ausência de sentido e significado para o sofrimento e, de alguma forma, Deus parece ser sempre a resposta. O sofrimento é um grande mistério e esperamos que Deus nos ajude, ao menos, a encontrar um sentido e significado. Mas como?

 

“A Deus nunca ninguém o viu.” (1 Jo 4, 12)

 

Numa série que vi da Netflix, Raising Dion, fiquei impressionado com uma das personagens interpretada pela jovem Sammy Haney, que nasceu com osteogénese imperfeita do Tipo III, caracterizada pelo formato do rosto, baixa estatura e deformidade nos ossos longos. Pelo facto de ser deficiente motora, ninguém queria ser amigo dela. Por isso, ela diz ser… invisível.

O tímido, o imperfeito, o feio, o pobre, tende a ser invisível aos olhos dos outros. Custa-nos lidar com aqueles que a sociedade considera uma dor e, por isso, criamos o surpreendente mecanismo de defesa de os tornar invisíveis. Talvez seja o nosso coração que endureceu e tenha desaparecido.

Nunca vos aconteceu estar a falar com alguém que, de repente, começa a falar com outra pessoa? A mim já me aconteceu. Fiquei triste e sentido por me ter tornado invisível. É uma invisibilidade que se deve a um tipo de insensibilidade de quem volta o olhar para si. Leva-me a imaginar aquelas pessoas que reviram os olhos e deixam de ver. Quer isso dizer que os outros se tornaram invisíveis, ou essas pessoas ficaram cegas e pensam ainda ver?

Ser invisível é estar desapegado daquilo que os outros pensam, aceitar aquilo que somos, sermos simples nos gestos, palavras e acções, isto é, mais parecidos com Deus, o Invisível por excelência.

Deus pode ser invisível, mas quando nos damos conta da sua presença silenciosa, experimentamos como é insubstituível.

 

Miguel Oliveira Panão | Cronista (iMissio)

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