Há um momento que uma saudade diferente insiste fazer morada dentro de nós. Parece que houve um tempo em que a alegria fazia do nosso interior morada. Éramos mais pacientes ou quem sabe tolerantes. Ou um tempo em que sentíamos mais fortes, envolvidos com sonhos, pessoas bondosas. Ou éramos mais espontâneos, cordiais, disponíveis. Então, bate aquela dor da saudade. Não de uma fase da vida, de algum acontecimento marcante, mas saudade de nós mesmos. É hora de parar. Estaríamos gostando menos de nós?
Alguns eventos nos afetam. Uns mais, outros menos. Há desencontros nos relacionamentos, perdas, competições no trabalho, obrigações sociais, além da correria diária. Experiências essas, que podem ser obstáculos e motivações para endurecermos a ponto de sentir saudade do que já fomos. Poderia ser este o nosso pesar: o resultado da nossa percepção de um comportamento inadequado pela incoerência com os nossos valores e ideais.
Observamos que temos sido grosseiros, influenciáveis, cometendo equívocos repetidos. De repente, estamos descobrindo que o novo jeito de ser é para agradar quem queremos juntos de nós e, por isso, nos deixamos moldar, com credulidade e inocência infantis, permitindo a manipulação. Talvez estejamos com dificuldade em admitir que o maior equívoco tenha ocorrido ao idealizar as pessoas e criar expectativas que jamais serão correspondidas.
Teria o orgulho nos impedido de tentar outro caminho e fomos arrastados no mundo de insatisfações de quem caminhava perto de nós e, consequentemente nos perdemos? A nossa dificuldade de confronto pessoal possibilitou culpabilizarmos os outros, o mundo, as situações e criou barreiras que nos distanciaram ainda mais de nós? Incontáveis reflexões dão legitimidade à nossa saudade.
Diante disto, aponta um desencanto: iludidos estávamos quando deixamos de ser fiéis a nós mesmos. Aquele jeito bom de ser, e que sentimos falta, continua dentro de nós. Ele pode estar apagado e bem escondido, mas com possibilidade de acesso. No entanto, não podemos nos afastar do nosso ser e nos perder, deixando que o nosso melhor faça as malas e parta de vez. É preciso agir. É valioso colocar nossa atenção nesta saudade. Sobretudo, na ausência de nós mesmos. A suavidade deste desejo de retornar sinaliza, e se levarmos a sério, impede, que o corpo se manifeste com acentuada reação para avisar de suas aflições, num pedido concreto de socorro manifestado em sintomas de doenças.
Fica a reflexão: saudade de você? Isto pode ser muito bom! É o reconhecimento do bem que te habita, da luz interior que está acesa. Tome uma decisão, pois ela, a saudade, indica que há vontade do reencontro. Há esperança. Marque um encontro com você e se priorize! É um grande passo de responsabilidade pela vida, de busca da essência em detrimento da superficialidade. É a possibilidade de corrigir erros, de ter flexibilidade e amadurecer. É sobretudo, a confirmação de grandeza suficiente para não culpabilizar e castigar os outros pelas próprias escolhas. Resta corrigir a rota e viajar pela vida com a sua agradável companhia. Mais tarde terá motivo de gratidão além de muita companhia boa e saudável. Partir ao nosso encontro e resgatar valores, alivia o corpo de suas dores e a alma de seus clamores.
Odília Grilo – Psicóloga CRP 04-3634
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