«Que devo fazer para alcançar a Deus», perguntou o aspirante. «Para alcançar a Deus – respondeu o ancião –, há duas coisas que tens de saber. A primeira é que todos os esforços para o alcançar não servem de nada.» «E a segunda?», perguntou o aspirante. «Deves agir como se não soubesses da primeira», respondeu o ancião. (Anthony de Mello, SJ)
A oração é um estado de vida que se deve cultivar. Leva tempo. Requer atenção. Acima de tudo, requer consistência.
A consistência é o que eleva a simples regularidade ao nível de um relacionamento. É possível orar muitas horas, diariamente – só ou em grupo –, e, no fim, desenvolver muito pouca profundidade de alma. A consistência implica que eu regresse à consciência da presença de Deus, dia após dia, hora após hora, toda a minha vida, quer isso seja um acontecimento agendado quer não. É a consciência de Deus que me atrai, quer eu sinta alguma satisfação pessoal imediata, quer não. Tento chegar a Deus, quer eu sinta que Deus está a tentar chegar a mim, quer não.
Todos os relacionamentos precisam de ser alimentados – acima de todos, o relacionamento com Deus. Muitas coisas levam-nos para longe desse relacionamento. Vivemos no plano do tangível e alimentamo-lo através de coisas e acontecimentos e pessoas. São essas coisas que ocupam as nossas mentes. Tomamos como garantido o plano espiritual, embora nada nos possa afetar mais do que a sua perda.
Quando estamos sós ou deprimidos ou agitados ou assustados, as coisas materiais ajudam-nos muito pouco ou mesmo nada. Então, as coisas que possuímos ou arrecadámos podem, na verdade, ser parte do nosso problema. O que realmente precisamos, então, é de um ponto de apoio que só as coisas espirituais podem dar. Precisamos de ter a consciência de que, embora a vida não esteja nas nossas mãos neste momento, está, seguramente, nas mãos de um Deus que nos ama.
É este ponto de apoio do espírito que nos eleva das pressões do presente para a renovada consciência da constância eterna do Deus que quer o nosso bem e não o nosso mal.
Sem consistência de consciência, arriscamo-nos a darmo-nos ao imediato e ao efêmero, ao temporário e ao que não tem significado. Perdemos o nosso equilíbrio. Perdemos o sentido da nossa própria natureza, já para não falar do sentido da natureza de Deus. Perdemos o norte.
Então, a luz apaga-se da vida e a escuridão torna-se o estado mental, a cor do futuro, a tonalidade do presente.
É a consistência de consciência, o esforço de nos colocarmos na presença de Deus, uma e outra vez, no decorrer do dia, que nos prepara para a Presença residente, que é o lar da alma.
Quando desistimos da presença prática de Deus, não é Deus que se retira de nós; fomos nós que nos retiramos de Deus. Pegamos no nosso coração e demo-lo àquilo que, por fim, certamente o quebrará. Pegamos na nossa mente e assentamo-la em areias movediças. Demo-nos, como as folhas que caem de uma árvore no outono, àquilo que não pode durar, que não é duradoiro.
«Só em Deus – diz o poeta – repousa o meu coração.»
A longo prazo, portanto, é a consistência, o permanente voltarmo-nos para Deus, que prepara o caminho para a eterna presença de Deus, no aqui e agora.
«Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos, que Eu hei de aliviar-vos. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração e encontrareis descanso para o vosso espírito. Pois o meu jugo é suave e o meu fardo é leve» (Mateus 11, 28-30).
Joan Chittister
In “O sopro de vida interior”, ed. Paulinas
Publicado em 23.05.2018