“Há quem dê ofertas de mãos cheias e ninguém lhe é grato. Com efeito, a maneira como se dá vale mais do que aquilo que se dá.”
“O mentiroso” é uma das comédias mais conhecidas do grande dramaturgo francês do séc. XVII Pierre Corneille, texto que influenciará Molière. Dela recolhi uma frase destinada a ilustrar um tema aparentemente marginal, mas na verdade significativo.
Ao ajudar uma pessoa (mas podemos alargar o discurso a todas as ações) não é decisivo só o ato, o dom, o gesto, a intervenção. Também é relevante a “façon”, como diz em francês o escritor, ou seja, a maneira, o estilo, a forma. Este é um aspeto a que pouco se liga, sobretudo nos nossos dias tantas vezes desleixados e descuidados.
Se, efetivamente, se dá uma ajuda e se a faz pesar, é inevitável que ela perde uma boa parte do seu mérito. Se se dá a entender que se espera no futuro uma troca, dissolve-se a gratuidade.
Se se oferece um apoio de maneira negligenciada, como um aborrecimento ou um dever a liquidar no mais breve espaço de tempo possível, humilha-se o destinatário, dando-lhe a entender que se trata de um enfado.
O elenco poderia continuar também para muitas outras obras que se cumprem mal e de modo desaprazível, dissolvendo-lhes parcialmente, e por vezes totalmente, a eficácia.
O escritor alemão Heinrich Böll (1917-1985) observava, com razão, que «mesmo no exercício dos mesteres mais humildes, o estilo é um fato decisivo», faz parte da substância mesma da ação, e não só de forma exterior.
P. (Card.) Gianfranco Ravasi
Trad.: SNPC