A Igreja faz a Eucaristia, a Eucaristia faz a Igreja. A circularidade desse axioma da teologia da Eucaristia leva a uma compreensão mais profunda do mistério eucarístico. No mistério pascal, revelou-se plenamente a Trindade: o Pai confirmou definitivamente que Jesus é o caminho para chegar a ele e enviou o Espírito que possibilita aos homens trilhar esse caminho. Assim, dizer que a Igreja é constituída pelo corpo do ressuscitado é dizer que ela brota historicamente da unidade da Trindade atuante no mistério pascal. Partindo-se do mistério pascal pode-se compreender a Igreja como mistério de comunhão, porque comunhão é solidariedade a partir dos pobres.
O mistério pascal abrange a morte e glorificação de Jesus e, de certa forma, a vida toda de Jesus, enquanto historicamente a morte é consequência da vida e também no sentido de que a vida de Jesus foi uma existência pascal: continua passagem para o Pai. Deus Pai se solidariza com Jesus e assim com os “crucificados pela injustiça”. Essa solidariedade é coroada na Ressurreição: Deus faz sua a causa do pobre. O silêncio de Deus no Calvário significa, por um lado, que ele respeita tanto o homem que deixa que sua liberdade o leve até o último desvario, e por outro lado que ele ama tanto o pobre, a ponto de assumir sua causa até as últimas consequências.
O que se celebra na Eucaristia é o ser Igreja. Como a Igreja pertence intrinsecamente ao mistério pascal de Cristo, o momento em que ela se viabiliza, celebrando o ser Igreja, só pode ser memória do mistério pascal de Cristo. Nesse sentido, a Igreja é, pela ação do Espírito Santo, presença do Senhor ressuscitado. É o Senhor Ressuscitado, vivo, com toda a sua história e consequentemente, com seu mistério pascal.
Como o mistério pascal pode ser apreendido sob a categoria de sacrifício? A princípio, não se deve entender simplesmente como sinônimo de sofrimento, como popularmente ocorre, mas como ‘ação sagrada’, ou seja, ‘é a apresentação feita a Deus, de modo ritual, por um membro da comunidade para isso designado (sacerdote), de um dom concreto (vivo) com o qual o sacrificante se identifica para exprimir a sua autodoação respeitosa, com o objetivo de ser com ele transformado (…) e de ficar finalmente unido a Deus, que aceita com benignidade o dom e, por conseguinte, o próprio sacrificante, em plena comunhão de vida e amor. Ao celebrar a Ceia do Senhor, nos sinais do pão e do vinho, ao mesmo tempo, a comunidade retoma a oferta que Cristo fez de si mesmo na cruz e se inclui na mesma.
O corpo eucarístico é o do Jesus histórico, tanto quanto o do Cristo Ressuscitado. É o corpo sofrendo a paixão na cruz, pois o pão é ‘partido’ e o sangue é ‘derramado’, o corpo ressuscitado é glorificado. O sacrifício histórico é a vida, morte e ressurreição de Jesus. O Cristo está presente com seu sacrifício.
Neuza Silveira de Souza
Coordenadora da Comissão Arquidiocesana Bíblico-catequética de BH